quarta-feira, 15 de abril de 2009

O dia em que a Cidade Luz se apagou

No início, parecia apenas mais uma queda de energia, o que era comum naquela hora da noite em dias de chuva. Ele não entendia como um país de primeiro mundo, como a França, poderia apresentar tantos problemas de energia. Resolveu ter paciência por alguns minutos, apesar de se aborrecer pelo fato de que estava prestes a conversar com seu amor pelo skype. Depois de meia-hora, cansou de esperar e resolveu que iria simplesmente ligar o laptop pela bateria mesmo, mesmo estando no final. A raiva veio quando abriu o aparelho e nada aconteceu. Teria o laptop que estragar logo naquela hora? Pegou o celular para canalizar a sua raiva no Twitter e, vendo a tela apagada, desconfiou de que algo estava muito errado. Resolveu subir as escadas e olhar pela janela. Ao ver a imensa escuridão lá fora e perceber que apenas ouvia pessoas conversando e gritando, nada de veículos ou sirenes, chegou à conclusão de que não falaria com seu amor naquela noite. E nem tão cedo.

Ouviu pânico na escadaria do prédio e pensou em dormir para não ter que se somar às pessoas enfurecidas e desamparadas. Assim, com a esperança de acordar e encontrar a cidade luz normal de volta, com todos indo ao trabalho e comentando sobre o incidente da noite anterior - nada mais que uma queda de energia - adormeceu.

Fortes pancadas na porta o acordaram. Pegou o celular para ver as horas e subitamente lembrou do que aconteceu antes de dormir. Esperava que fosse um pesadelo mas, além do celular, do laptop, da TV e da própria luz, nada funcionava. As pancadas na porta ficavam cada mais enfurecidas, acompanhadas de altos gritos. Lembrou-se do velho despertador à corda que encontrou no apartamento no dia em que chegou à cidade, seis meses atrás. Às vezes lhe dava nostalgia olhar para aquela coisa, o que o fez mantê-lo funcionando. Para seu deleite, o velho relógio fazia tic-tac e marcava seis e trinta e dois. Finalmente, abriu a porta e se deparou com uma velha senhora, sua vizinha da frente. "Nós todos vamos andando para o centro, fazer uma passeata para que a energia volte. Este mundo está perdido. Dizem que nada em Paris funciona, os policiais estão desorientados e mesmo assim tentam acalmar a gente". Respondeu que iria fazer as malas e daí a pouco se juntaria à ela.

Ao fechar a porta, o pânico. Lembrou-se de tudo que já tinha lido sobre bombas eletromagnéticas, dispositivos que inutilizam todo tipo de aparelho eletrônico num raio de muitos quilômetros. Lembrou-se da sua bicicleta. Pegou seus pertences essenciais mais alguns sanduíches e saiu pedalando em direção à cidade mais próxima para achar um telefone que funcionasse. Passou por uma praça na qual centenas de pessoas se aglomeravam em torno de um homem que, de pé sobre um banco, dava notícias para todos. "Acalmem-se, eu já disse. O pânico não ajudará agora. Acabei de sair da prefeitura. Conseguiram receber algumas mensagens por código morse, as notícias não são nada boas. Pelo que parece, a europa inteira está no escuro. Praticamente nenhum aparelho eletrônico funciona. Eles suspeitam do tal tsunami solar, ainda não sabem se o outro lado do mundo também está assim. Vocês precisam..."

Parou de ouvir o discurso para entrar na total desolação. Sabia que não era só a Europa que estava no escuro. Se lá era noite quando tudo ocorreu, os tais raios devem ter atingido o outro lado da Terra em cheio, já que estava diretamente exposto ao Sol. Soube que o mundo inteiro nunca mais seria o mesmo depois daquilo tudo. Demorariam anos, talvez décadas para reestruturar a aparelhagem eletrônica em todos os países. Isso se não ocorressem mais tsunamis solares. O mundo inteiro estava perdido. Uma nova Era acabara de começar ali, naquele dia. Mas tudo que ele queria era ficar junto do seu amor, que estava muito longe, no Brasil. Com um misto de tristeza, euforia e obstinação, levantou a bicicleta e começou pedalar.


Crônica inspirada nesta notícia.

quarta-feira, 4 de março de 2009

Relato de um doente

Pecamos por não valorizar nossa saúde quando a temos. Pode soar estranho, mas é só ficarmos doente que damos um valor imenso àqueles dias que acordávamos sem queixas de dor. Pergunte pra qualquer doente se o desejo dele naquele momento é ter uma Mercedes Benz, uma mansão na Costa do Sauípe, um jatinho particular, ou a sua saúde de volta. Por mais que existam loucos, a maioria deles ainda optaria pelo bem estar.
Com a saúde plena, os problemas da vida tornam-se prioridade, como aquele emprego que você não tem, ou aquela reforma em casa que você não sabe como fazer. Mas sem ela, parece que todos estes problemas viram faíscas, diante de um fogo que nos consome, chamado doença.
Dizem que as doenças têm um cunho emocional. E dizem também que o Lula é o melhor presidente que o Brasil já teve. Não que eu discorde piamente da idéia (da primeira, claro), mas acho que fica muito vago jogar a culpa no emocional. As bactérias e os vírus também têm a sua culpa no cartório, estas criaturas que são assustadoras... ao serem olhadas através das lentes de um microscópio. É difícil entender como coisas tão pequenas fazem estragos tão grandes. Nosso corpo é mesmo muito frágil.
Quando a doença acaba, a gente mergulha na rotina dos problemas do dia-a-dia e, de novo, esquecemos de dar valor à nossa saúde, aquela que poucos dias atrás rezávamos para tê-la de volta.
Em um dia que tudo dá errado, pare e pense que o que importa mesmo é ter saúde para viver o nosso bem mais precioso: a própria vida.

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Passado que passa, futuro que vem.

Com o perdão do plágio – são as águas de novembro fechando meus passados verões. Passou, ou melhor passaram 23 anos e eu estou intacta, pronta para os próximos verões, primaveras e capas de notícias que virão. Acabou a ditadura, o frenesi dos anos 80, o Collor caiu, a internet veio de vez, o celular diminuiu e depois cresceu de novo. O muro de Berlim foi ao chão, as Torres gêmeas viraram buraco turístico e a guerra do Iraque ridiculamente começou e não terminou. A Xuxa perdeu audiência, os Simpsons viraram filme e os filmes da sessão da tarde não mudaram. O Lula finalmente foi presidente, as CPI’s viraram moda, o Jõao Hélio chocou, depois a Isabela Nardoni e o caso Eloá – até vir o próximo que rapidamente todos vão esquecer.

A China sediou as olimpíadas, o Brasil perdeu a copa de 2006, o Dunga de repente virou técnico da seleção, o Maradona também, o Pelé ainda é o Deus do Futebol e os novos jogadores revelação estão na Europa fazendo bobagens. O volêi ganhou muitas ligas, alguns ginastas levantaram vôo e depois cairam, a natação as vezes vira notícia e o Rubinho continua quebrando. O dólar caiu muito, depois subiu demais e enfim, a crise pegou, fazendo do Brasil o destino dos brasileiros viajantes frustados que queriam ir para o exterior. Veneza não afundou por completo, o apocalipse não rolou, mas a natureza acabou se manifestando em formas de chuvas, furacões e furiosos tsunamis. E, é claro, que o Silvio Santos ainda distribui dinheiro, o Faustão ainda é um tanto quanto desagradável e TV aberta deixa muito a desejar.

E para falar de música, os Beatles continuam em parte vivos e idolatrados e os Rolling Stones ainda ficam em pé. A nova geração do rock não parece rock e a velha geração ficou um tanto quanto sumida. A Bossa Nova fez 50 anos, a velha bossa fez muito mais, o Roberto Carlos ainda grava um cd novo todos os natais e tem gente que insiste em falar que pagode é samba. Samba me lembra carnaval, que na verdade virou trio elétrico em cidade do interior, regado a excessos de axé e muito funk. Verão não é mais só em dezembro, pode aparecer em qualquer dia do ano, assim como todas as outras estações. Nessa loucura temporal o Brasil teve terremotos, chuvas de granizo, enchentes, secas e, o mais incomum, faz dois anos seguidos que não chove nos dia dos mortos.

Agora, como não poderia nunca me esquecer, o mundo continua louco, a violência ainda tá pegando e os carros em breve já virão blindados. Andar na rua pode ser uma aventura e o Brasil só concorre ao Oscar com filmes violentos e inundados de tiros pelo Rio de Janeiro – esse por sinal, continua lindo e lotado de turistas. Ir para o nordeste é cada vez mais caro e na Bahia continua a mesma e deliciosa calma de sempre, com baianas não tão calmas assim, um pouco mais espertas para lidar com turistas e com os mesmos e excelentes e apimentados acarajés.

E assim, o mundo continua indo, mas com os freios cada vez mais danificados. Tudo é acelerado, o tempo agora é cada vez mais rápido e os relógios não conseguem descansar. A vida é corrida e quando se quer fugir por um tempo, ao voltar parece que se esteve na lua – pois tudo já está completamente mudado. Lua que me lembra que insistem em perturbar a possibilidade de vida em Marte e caso encontrem algo por lá, não imagino que vem coisa boa por ai. Nesse meio constante de informações demais, eu, assim como vários outros, tento fazer minha parte a encontrar meu espaço.

Ultimamente me entreguei ao ritmo acelerado, difícil de manter, mas ando me saindo bem. Talvez tenho apenas que parar um pouco, como agora ao escrever esse breve e incompleto histórico dos meus calendários completados, e perceber que ainda tenho muita história para viver, ver, ouvir falar e porque não, escrever. Afinal de contas, o papel ainda não foi extinto, algumas pessoas ainda lêem livros e crônicas no jornal e a moda dos blogs criou inúmeros novos escritores, ou ao menos pessoas quem aspiram essa habilidade.

E, enquanto a vida corre solta por ai, eu me concentro no que de melhor ela pode me oferecer neste momento – o auge da minha juventude corrida, frenética e absolutamente deliciosa. Conselho que devo ter lido em algum livro auto-ajuda, pois esqueci de contar, nesses últimos anos eles viraram os novos best sellers. Quem sabe ainda escrevo um: Como Ver O Tempo Passar Já Que Ele Passa Rápido Demais.